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Intervalo Analítico entrevista Sergio Nick, vice-presidente da IPA

“Outro desafio é o que tentamos encarar com os temas do Congresso Internacional de Psicanálise de Boston, que irá tratar da técnica psicanalítica em um mundo cambiante. Como se adaptar a um novo mundo sem perdermos nossas referências? Não é tarefa fácil..."


MA: Fale um pouco sobre a sua trajetória profissional.

SN: Bem, depois de fazer medicina na UFRJ, com internato no IPUB/UFRJ, fui fazer dois cursos de pós-graduação: Aperfeiçoamento em Psiquiatria Geral e em Psiquiatria e Psicoterapia da Criança e do Adolescente, este na COI/IPUB, com forte influência psicanalítica. Na época, eu trabalhava como psiquiatra do Exército, no esquema CPOR, por 5 anos, onde aperfeiçoei bastante o trato como psiquiatra e psicoterapeuta. Ao final desta etapa, iniciei a minha formação psicanalítica na SBPRJ, que culminou com a formação como psicanalista de criança e adolescente nesse mesmo instituto. Mais tarde, fui fazer outra pós-graduação na UERJ, em ‘Direito Especial da Criança e do Adolescente’, com estágio no Juizado da Infância e do Adolescente. Tendo trabalhado em hospitais

apenas até finalizar o meu período como psiquiatra militar R/2, minha carreira foi primordialmente voltada para o trabalho como autônomo. Eu abri o meu consultório em 1981 e, até hoje, trabalho primordialmente como psicanalista. Como fruto de minha inserção no Direito, faço muitas perícias na área de Família, Órfãos e Sucessões, na qual a interdisciplinaridade de Direito e Psicanálise traz uma escuta diferenciada às questões jurídicas que surgem nos Tribunais. Por outro lado, fruto da minha verve organizacional, tenho sempre trabalhado nas organizações por onde passei: SBPRJ, Febrapsi, Fepal e IPA, tendo ocupado os cargos mais variados. Penso que o estímulo para isso veio do clima que encontrei na SBPRJ quando lá cheguei. Era um clima de assembleia permanente, muito democrático, com assembleias cheias e muita gente pensante. Fiquei muito impressionado com os debates que, mesmo acalorados, tinham uma abertura para o diálogo e uma profundidade de argumentações que nos faziam ficar até bem tarde no auditório! A intervenção da IPA quebrou esse clima tão frutífero, provocando todo tipo de reação. A minha foi adentrar cada vez mais no âmbito politico, entendendo que só na luta política se poderia mudar aquele estado de coisas.


MA: Você é vice-presidente da International Psychoanalytical Association – IPA. Como vê a SBPRJ dentro do cenário internacional de psicanálise?

SN: Em termos políticos, temos uma inserção muito forte, fruto dessa luta política por uma IPA mais democrática e aberta ao diálogo. Nossa participação nas últimas gestões, que culminou com a eleição do Cláudio Eizirik para presidente da IPA, foi e tem sido de interlocutores privilegiados e respeitados, mesmo por aqueles que não cultivam o mesmo entendimento sobre como gerir as coisas na IPA. Em termos técnicos, tenho ouvido muitos elogios a muitos de nossos colegas que se apresentam em Working Parties, Congressos e Jornadas Científicas. Nosso olhar, que se nutre de múltiplas fontes, parece-me despertar muito interesse e admiração. Ainda há pouca produção teórica de nossa parte, mas aos poucos vamos aumentando a nossa visibilidade para o mundo psicanalítico internacional.


MA: Qual o maior desafio atual da psicanálise?

SN: Existem vários desafios difíceis de enunciar em um texto pequeno como este. Em termos de IPA, há desafios que engendraram a criação de comitês para estudá-los, propor ações e soluções, como o da Universidade, o de Ética, o de ‘Outreach’ etc... Nesse sentido, creio que poucos da SBPRJ participam desses comitês da IPA e deveriam se propor mais a dar a sua contribuição e experiência. Outro ponto, também mapeado pela IPA, é a inversão da pirâmide etária entre os psicanalistas. Penso que a SBPRJ tem demonstrado como fazer para atrair e formar gente jovem, quetraz novidades e entusiasmo ao campopsicanalítico. Outro desafio é o que tentamos encarar com os temas do Congresso Internacional de Psicanálise de Boston, que se trata da técnica psicanalítica em um mundo cambiante. Como se adaptar a um novo mundo sem perdermos nossas referências? Não é tarefa fácil...


MA: Qual a importância da pluralidade de escolas dentro de uma sociedade para ofuturo da própria psicanálise?

SN: Penso que a pluralidade é hoje reconhecida pela maioria das sociedades como fundamental para o desenvolvimento dos institutos. O que é novo é a maior abertura para outras escolas, outros saberes, a interdisciplinaridade. Nesse sentido, a SBPRJ tem caminhado em sintonia com o que se tem feito na contemporaneidade, creio eu.


MA: O que diria a um jovem que pretende começar uma carreira em psicanálise?

SN: Primeiro, pense bem se você quer mesmo ser um psicanalista; se você é um sujeito capaz de suportar bem a dor, a angústia e o sofrimento (pessoal e alheio). Respondendo sim a essas questões, busque o melhor analista para você: alguém que realmente possa te conhecer e te mostrar aquilo que você não conhece bem de si mesmo, alguém com quem você sinta a confiança para abrir o fundo de sua alma. Se possível, ao mesmo tempo, busque atender o máximo possível de pessoas em psicoterapia. Só assim você saberá o que é o trabalho e ganhará experiência para se desenvolver. E, por último, seja honesto consigo mesmo. Sempre.


MA: Tem alguma frase que carrega consigo como inspiração nos momentos difíceis? Algum pensamento que vem lhe acompanhando pelo seu caminho?

SN: Muitas frases: ‘Assim é, se lhe parece’ define bem o que é o psiquismo, bastante distante da realidade compartilhada e lógica. Outra é: ‘Caminhante, não há um caminho, o caminho se faz ao andar’.


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