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Entrevista com Luiz Aquila

"Sou carioca em Petrópolis, casado, tenho filhos e netos. Sempre tive vontade de ser pintor. A pintura me puxou. São imperativos pessoais, a necessidade de pintar, a necessidade de manter a criação plástica em movimento."


Em que ponto você está?

Vou voltar um pouco no tempo! Retomando aquele depoimento de 2010... que lhe inspirou essa nossa conversa. Meu pai era arquiteto, um arquiteto modernista. Num determinado momento, a questão da aplicação da arte passou a ser crucial para ele e foi nesse momento que decidi ser pintor. Ele dizia: “Por que você vai fazer uma coisa tão circunscrita, com uma forma de produção tão antiquada?” “Porque não faz cinema, como os seus amigos?"


Quem sabe lhe estimulando a uma abrangência maior?

Claro. Mas também questionando a função social das artes plásticas. Um exemplo: se a referência for o público, seja com obras múltiplas ou seja com obras únicas, sempre estaremos na dependência da quantidade de pessoas que veem essas obras. Uma pintura, você pode ter gente vendo durante 100, 200 anos e você vai somando essas pessoas, na verdade você terá muito mais público do que em outras manifestações artísticas voltadas para a produção múltipla.


E você se tornou pintor e pintor abstrato sem culpa nenhuma...?

Isso mesmo! Mas, na minha geração, não são mais as referências externas que contam. Aquelas pinturas mais abstratas da minha geração, em geral, não partem da natureza, nem mesmo de sua abstração; O assunto da pintura é a pintura, a sua própria forma. É forma e conteúdo e motivo, ao mesmo tempo. A cor é o elemento mais direto. A cor é um pouco, talvez, como o ritmo na música. A cor te toca imediatamente. E eu acho que a arte brasileira é, às vezes, um pouco tímida em cor. Às vezes, a arte brasileira tem uma vontade de ser fina e educada, europeia. Isso é histórico, vem desde o movimento modernista.


Mudando de assunto, ou puxando brasa para a análise, como se dá a satisfação, nesse misterioso e surpreendente mundo? Podemos aproximá-lo um pouco mais?

Eu acho que a arte cria pontes dentro do indivíduo. Pontes entre suas fragmentações. Ela amarra. Por isso que eu estava dizendo: se nós fôssemos inteiros, “satisfeitos”, não precisaríamos de arte. Eu acho que o artista é quem tem mais essa percepção de ser incompleto e mais a sensação do buracão que está na nossa frente!


Continue...

À medida que a vida vai transcorrendo, que as situações vão mudando, você vai procurando novas razões para pintar, assim como você procura novas razões pra viver.


Sua pintura muda quando você está em outro lugar?

Não, eu só preciso de um lugar que seja adequado e que eu me sinta bem pra pintar. Mas eu não tenho muita influência do espaço em que estou pintando, da cidade ou da paisagem. Agora tenho influência dos trecos da minha vida, das coisas que estão no entorno, dos materiais, das tintas, do pedaço de jornal que estou lendo que eventualmente pode grudar no quadro, dos outros materiais que fui comprando, pensando em utilizar lá atrás e que não utilizei, mas que continuam lá, e tem um momento que parece propício. Então o que muda é a carga de afeto que você dá aos materiais e à materialidade.


Disse que aceitava com prazer fazer essa entrevista também pela gratidão à psicanálise...

Muita gratidão! A minha análise começou em um momento muito complicado da minha vida. Felizmente encontrei o meu analista! Na minha geração, pouquíssimos artistas viviam de seu trabalho, e isso preocupava muito as famílias. Pais, mães, tios diziam: “você vai morrer de fome. Veja aí as pessoas como estão”. Aqueles que decidiram ser artistas plásticos eram aqueles que tinham aceito o projeto do fracasso!

A psicanálise, ao mesmo tempo em me aproximou do meu afeto, dos meus projetos e interesses, ela me viabilizou na prática. Eu me tornei uma criatura muito mais viável. Comecei a participar de debates, pude dirigir escolas, pude dar aulas melhores. Acho que sou um segundo Áquila depois da análise. E à medida que você vai organizando o seu afeto no processo analítico, você vai dando qualidade plástica ao afeto na pintura. Você tem muito mais capacidade de lidar com elementos interiores seus.


Já se cogitou que a análise pudesse inibir a criatividade do artista...

Eu acho que fiquei mais espontâneo depois da psicanálise. Francis Bacon disse: “a tela em branco dá medo porque ela não está em branco”. Ela tem todos os seus preconceitos, valores e símbolos projetados ali. Então, o que dá medo no artista é a demolição de todo esse vocabulário, de todo esse repertório pra fazer a tela ficar branca, pra ele, a tela dele. Isso tem a ver com um trabalho de análise, não?!


Obras/exposições/livros no site: www.luizaquila.com.br





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